sexta-feira, 22 de junho de 2007

(S) Em tempo

Incontáveis e inocentes horas de espera
fila indiana para rotineira burocracia
relógio-ponto não dignifica; condiciona e policia
Incolor, outro entre tantos dias se encerra

No templo de mil mentiras pedia perdão pela libido
anestesia via controle-remoto inoculada lentamente
frêmito de angústia, último suspiro impaciente
- Fui enganado! usurpado! iludido...

O sangue gélido acusa a hora de morrer
pior é a certeza de não ter podido viver
Finalmente querendo gritar, despedia-se mudo

Enfim...
a morte é o fim
Eis tudo.

(Zé.)

Um verso...


Livre para fracassar...

O escritor e seus múltiplos vem vos dizer adeus.
Tentou na palavra o extremo tudo
e esboçou-se santo, prostituto e corifeu.
A infância foi velada:obscura na teia da poesia e da loucura.
A juventude apenas uma lauda de lascivia, de frêmito,
tempo-nada na página.
Depois, transgressor metalescente de percursos
colou-se à compaixão, abismos e a sua própria sombra.
Poupem-no o desperdício de explicar o ato de brincar.
A dádiva de antes (a obra) excedeu-se no lixo.
o desassossego é apenas resíduo de um desencanto.
E hoje, repetindo Bataille:
"Sinto-me livre para fracassar".

Coiote Martinez

quarta-feira, 20 de junho de 2007

EDITORIAL:

Saudações visitantes e leitores (as)!

Somos um pequeno grupo de amigos e escritores xapecoenses que, mal ou bem, escrevem, e isso é fato. Resolvemos, depois de conversas regadas a vinho e boa música, fundar este espaço para postar algumas de nossas linhas malditas e/ou mau-ditas. Queremos com isso, nada mais do que propagar nossas escritas (contos, crônicas, ensaios e poesias), e fazer valer a nossa vontade de livre expressão. Serão postados aqui também, escritas de outros (as) que tenham um mínimo de coerência e afinidade com nossa 'causa', que além de maldita, é nobre (porque não). É bom que se diga: não pertencemos ao quadro da ACHE (Associação Chapecoense de Escritores), nem tampouco a 'grupelhos literários oficializados' que não fazem mais do que gabarem-se frente a decadência de suas condições. Gostando ou não do que lerem aqui, comentem, entrem em contato, façam a comunicação fluir - só 'não nos venham encher o saco' quando por 'des-ventura' pequenos erros de português forem encontrados aqui, pois não somos mestres em gramática e isso não é um livro impresso - Sendo assim, sejam bem vindos ao 'subterrâneo' da literatua xapecoense! Sem mais delongas...

Boa Viagem!

Poesias...


ESCREVO LUA

Se as lágrimas e minh'alma
Cantam neste imenso vazio
É porque aboli todas as mentiras
E não sou mais que este instante
No ato de escrever lua.


Liza A. Bueno
No cotidiano...

Devo engolfar-me em tuas rimas,
Devo-me um perdão...

A luz que me castra a visão
É a mesma que ilumina meu caminho.

Num emaranhado de lições me perco,
Já não me acho,
Já não sou eu mesmo.

Desprendo-me de toda a verdade,
Busco o sonho,
Desprezo toda a estirpe.

Emano da tempestade,
Sou caso insolúvel...

Por mais lépida que pareça minha imagem,
Sou composto de melancolia.
Em mim há muita tristeza,
Sou fortaleza em dor.
Mas isso não me supera a benevolência,
Prossigo rindo-me.
Gargalho ao emancipar-me das convenções.

Estou liberto e assisto impassível as ilusórias hipocrisias
[dos dias úteis.

Herman G. Silvani (Niko)

Crônica literária

Um altar para...

Meu nome... Bem, por enquanto isso não importa. Ou não importa muito. O que faço... Ah, disso tenho de falar! É algo que não pode passar em branco, assim como o final da novela ou a ida rápida ao bar preferido. Para todos os efeitos sou um sedutor. Minha especialidade? Seduzir. Agora mesmo, enquanto escrevo essas linhas, que cá entre nós, são tão ou mais sedutoras que eu, algumas meninas babam sobre mim, os olhos vidrados, tomadas por essa espécie de torpor que somente seres iluminados como eu são capazes de causar. Para dizer a verdade, mereço um altar, mas não um altar qualquer desses que encontram-se nas igrejas destruídas, não, não. Quero um altar de sacrifícios, como dos antigos cultos pagãos. O que quero em oferenda? Suas mentes, suas já diluídas mentes para minha coleçãozinha particular. Desejem-me! Carreguem-me junto ao seio, ao pé do ouvido, vamos de mãos dadas rumo a um entorpecimento maior.
Sou um profissional. Penetrar em seus tolos corações não é tarefa para principiantes. Por isso me transmuto, altero formas, cores, tamanhos. Sou o mesmo e nunca o mesmo. A música que sai dos meus lábios para seus torpes ouvidos encanta. Naufragaria navios se forças para tanto tivesse. Mas tenho cá uma carga de modéstia. Basta naufragar seus cérebros no poderoso absinto de meu cristal líquido. Estou cada vez mais pequeno, notaram? Mas esse detalhe, de tão pequeno, não lhes passa despercebido. Faz parte do meu show. A multiplicidade de minhas funções aumentou na mesma proporção em que eu diminuí. Convenhamos, sou ou não sou irresistível? Gosto de meninos e meninas, estou em todas as baladas descoladas, me carregam a tira colo, sou idolatrado, invejado, cultuado... Ufa!
Canonizar o Papa? Madre Tereza de Calcutá? Ora, convenhamos! Existe alguém hoje com tamanha capacidade de curar como eu? Não estou falando de cânceres, carcicomas, hemorróidas, conjuntivite, gastrite, bursite, não! Isso é coisa para charlatões de quinta categoria. Meu negócio é impedir que vocês pensem. Mas não creiam que estou sozinho nessa empreitada. Também tenho meus apóstolos. Chamam-se: televisão, jornalão, internet’s, o Paulo Coelho, e alguns escritores chapecoenses, mas esses eu descartei, queriam competir comigo, vê se pode? Com o novo deus? O que traz a mensagem de uma nova era.
Curvai-vos pois, servos engalanados da ignorância, que hinos soem de suas pútridas bocas, e que depois deles, apenas um nome se ouça: o meu... ou de meus pseudônimos: Nokia, Motorola... Mas se me chamarem celular, eu atendo.

A. Diógenes Gluzezak

terça-feira, 19 de junho de 2007

Um conto...

ABEL E CAIM
E O REBANHO
DO MAL



Há muito tempo, numa terra de sol escaldante, onde as primeiras crias terrestres edificaram-se nas cálidas montanhas, vivia Abel na plenitude de sua juventude. O rapaz era de descendência divina, linhagem de Javé, o soberano e vingativo Deus das férteis terras que formam o ocidente e o oriente.
Naquele tempo, onde o remoto era contemporâneo, o arcaico era novidade, Abel foi presentead
o com um rebanho de carneiros celestiais. Daquele rebanho Abel tiraria o alimento diário; seria sócio do grande Deus: ofertaria uma quantia razoável de tempos em tempos, em cumprimento do contrato angélico firmado entre criador e criatura.
Abel deliciava-se com a vivência terrena. Tudo era promissor para o jovem criador de carneiros; a terra estava isenta de todo e qualquer mal.
Próximo de Abel vivia outro jovem, um bravo trabalhador chamado Caim. Todavia, Caim não lidava com carneiros, pois acreditava que ainda lhe faltava o discernimento para “conduzir um rebanho”. Vivia de suas precárias colheitas de legumes e verduras; o brasido da terra no fulgurante sol de uma única estação, e a praga devoradora dos carneiros de Abel, não deixavam sua lavoura tornar-se promissora. Andava ele no sacolejo do esbravejamento no reponte do maldito rebanho: o que era divino para um, tornava-se infernal a outro.
O festejo de Abel era a magoa de Caim.
Sempre que Abel amolava uma de suas fartas ovelhas e oferecia a Javé, em gratidão ao bem recebido, Caim esbravejava em ira reivindicando seu suor e suas lágrimas, as quais engordavam o rebanho de seu conterrâneo.
- Com meu trabalho sacio a fome d’aquele que não me vê. Estou farto de plantar o alimento que faz crescer o rebanho e engrandecer a minha miséria.
No alto de uma montanha Caim sentou e chorou.
Nenhum deus o acolheu.
Suas lágrimas umedeciam a terra seca e eram suas únicas companheiras.
Ruído pela fome semeou outra vez.
Regou a terra com lamento e esperança de tudo ser diferente; tinha no forte punho a energia que germinaria a semente e traria o fruto de sua vida; seus olhos acariciavam o broto que surgia entre os torrões e formavam caule e folhas: a alegria voltava a seu sereno rosto. Em alguns momentos Caim ousava até mesmo sorrir.
A semente se fez fruto.
No dia em que Caim ganhava o rumo de sua lavoura, a cena se repetia: o rebanho demoníaco devorava o fruto de seu trabalho; sua plantação em pouco tempo se tornara extinta. Caim perdeu a força e tombou de joelhos ao chão. Implorou a Javé que revertesse o mal que acabara de haver; pediu entre lágrimas e urros o alimento da vida; orou ao Senhor em forma de clemência: de nada lhe foi útil. Não teve nem mesmo a energia de afugentar os malditos carneiros: parou e apenas contemplou o acontecido.
Refletiu então o ocorrido e tirou a lição necessária ao acertar de contas.
Procurou Abel para relatar o desastre que o assolava desde sempre.
- Deves olhar para o que sou, – disse Caim para Abel – minhas lágrimas e meu suor deram o peso em seu rebanho, e, o pior de tudo, diante de teus olhos.
- Essa é a vontade divina – retrucou Abel.
- Será também à vontade de Deus que minha lavoura seja regada com teu sangue; que as sementes que nela eu semear, floresçam com sua alma; que o fertilizante seja o teu corpo e o teu ar de trapaça seja a energia que a fortalecerá.
Dito isso, Caim estraçalhou Abel sobre seu novo e promissor canteiro.
Um sorriso definitivo tomou conta de sua face ao ver a terra que tanto amava coberta pelo precioso liquido vermelho da vida; essa seria uma colheita e tanto; nada mais estava entre ele e seu labor: viveria agora apenas de seu engenho, sem ninguém mais para atravancar seu caminho.
Javé, primeiramente irou-se com tal ato.
Indagou Caim acera de Abel, ao que ouviu:
- Abel é parte integrante da terra. É a energia que fará crescer e multiplicar tudo o que há sobre ela; Abel voltou de onde seu pai saiu, portanto, do pó divino onde se faz o regresso a todo homem.
Javé pasmou-se ao ver tanto engenho em uma pequena criatura.
Decidiu não liquidá-lo; mais ainda, resolveu dar a ele, pela sua bravura e determinação, toda descendência humana. Seria ele, segundo a vontade divina, o elo que ligaria Deus a toda humanidade. Caim seria, desde aquele instante, o principal personagem da existência humana; garra, força de vontade, engenho e arte, seriam coisas instrutivas que Caim legaria as gerações futuras.
Como não houvesse outro jeito, Caim se impôs na terra e reivindicou a adoração divina.
Sua reivindicação considerou a seguinte questão:
- Não devo correr o risco de ser assassinado por nada que habite a terra.
O Senhor, baixando a guarda celestial, concedeu então a Caim um sinal em seu corpo:
- Qualquer que seja que atentar contra ti meu filho sofrerás as iras divinas, e serás aniquilado diante de meu trono.
O pacto fora feito.Caim tinha algo de angélico ao andar nas cálidas montanhas do que hoje chamamos de Oriente Médio.

(Marcio S.)