segunda-feira, 11 de agosto de 2008

& não há fim...

PARTE V

O baile...

Erasmo seguiu e encontrou gentes; Machados, Barretos, Carlos, Clarices, , Adélias, Ferreiras, Antonios, Marias, Kerouac, Tchechov, Poe, Pessoas ....
Não entendia, no entanto, o porquê de nenhum deles ir ao baile. Não sabia ele que aqueles homens, mulheres e loucos não possuíam máscaras.
E, assim, sucederam-se os e(ventos) em rajadas tristes, carruagens passavam em sinais conduzidas por homens também tristes.
E a loucura, então, entristeceu-se e o mundo silenciou mais uma vez em metáforas brancas. Alaúdes transportavam silêncios.
Erasmo, único em seu grito abafado, rasgava em tentativas insanas o asfalto, e, passados longos anos do poema, procurava, em meio à náusea, a flor que insistia em não desabrochar.

...à Xapecó com tristeza.

Antonomásia.

* * *

EMBRIAGAI-VOS

É NECESSÁRIO estar sempre bêbado. Tudo se reduz a isso; eis o único problema. Para não sentirdes o fardo horrível do Tempo, que vos abate e vos faz pender para a terra, é preciso que vos embriagueis sem cessar.
Mas – de quê? De vinho, de poesia ou de virtude, como achardes melhor. Contanto que vos embriagueis.
E, se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na verde relva de um fosso, na desolada solidão do vosso quarto, despertardes, com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, perguntai ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a todo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai-lhes que horas são; e o vento, e a vaga, e a estrela, e o pássaro, e o relógio, hão de vos responder:
- É a hora de embriagar-se! Para não serdes os martirizados escravos do Tempo, embriagai-vos; embriagai-vos sem tréguas! De vinho, de poesia ou de virtude, como achardes melhor.

Charles Baudelaire

(Pequenos Poemas em Prosa)

Cão andaluz

Meio-dia em ponto. Sol a pino incidindo pontualmente entre os dois, dividindo simetricamente o
banco da praça e tudo aquilo que ligava um ao outro. Desperta, ela observa um cão que se aproxima dele
querendo brincar. Põe suas patas sobre as pernas dele, que distraído, retribui acariciando com força a
cabeça do cachorro. Ela sabe que é uma fuga, um subterfúgio para adiar aquele momento. Mas ao
mesmo tempo sabe que não importa, pois já está tudo acabado. Num gesto que diz mais que palavras,
bate as mãos nas pernas, chamando o cachorro, que de um pulo sobe em seu colo. Nenhuma palavra, os
três apenas contemplam o dia. Agora que o sol já não incide mais exatamente entre os dois, ela recosta a
cabeça em seu peito, fecha os olhos e suspira, enquanto ele beija seus cabelos pela última vez. Ela sabe
que foi melhor assim. Ambos levantam, resolutos mas tranqüilos, e cada um caminha em direções
opostas. Ela não olha pra trás, mas ouve o cachorro latindo. Parece procurar o sol.

André Timm

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Bailes, Máscaras e(ventos)...

Parte IV

As máscaras...

O baile! O baile se aproximava. Era preciso uma máscara, uma máscara... Deus!!!!! Uma máscara.
Os ventos soturnos e angelicais sopravam versos de um classicismo puro, branco, límpido, perene...
- Não!!!
E Erasmo gritou, cuspiu, vomitou náuseas... nauseabundos urros de cólera eternizados em escarros melancólicos.
A loucura, a demência, a insanidade, a autenticidade humana se revelava.
- Não!!! Não as atrocidades brancas, incautas, homófobas, proféticas... miseráveis.
Não a padronização estética, estática, extenuante.
Não a hipocrisia metaforicamente disfarçada de doação...
Não podes dar-me o que me é...

continua...

Antonomasia.

Depois de um tempo...

...quando compreendi, ouvi de não sei quem:
- Este garoto tem vocação para cavocar crateras!
Cresci... e sigo á camuflar formigas
Tenho dom para desencantar o encanto
Nasci assim, destinado ao fracasso,
Amaldiçoado, empoeirado, semi-vivo...
Mas prossigo tateando abismos
E na desconstrução do conceito,
Encoberto palavras terroristas
Para que fujam de mim

Na beleza torta deste mundo tão vulgar!

D'el Tango.



Bailes, Máscaras e(ventos)...

Parte III

À noite, os cães e os homens...

Era uma noite fria do ano de 2008, dividia sobras em uma marmita de metal acompanhado de cães moribundos e o Uivo de Ginsberg, influenciava-se em Bukowski e Rimbaud... sua estação era, ao contrário, o inferno. Não presenciara em sua efemeridade tanta lucidez absurda...
Queria “enlouquecer”, cantar poemas de horror, ódio e amor... gritar, urrar versos em prosa violentando margens de papel e jornal...
Matilhas o acompanhavam a roer ossos e ofícios... azeitonas argentinas “sobremesadas” com alfajores baratos. Era clássico em suas sandálias contrabandeadas. Em que não se pese a avareza, recebera algumas em campanhas, donativos.
Precisava beber algo...

continua...

Antonomasia.


*.*

Então hoje, logo hoje, eu dei de cara com o sujeito outra vez, mas será a ultima, eu juro. Este indivíduo arranhado pela vida, este cara antigo, antipático e anti-social. Um andarilho solitário das confusas ruas do amor. Eu prometi tantas vezes não ver este cara nunca mais. Mas, vez ou outra, me vejo de cara com ele. Este insatisfeito, incompreensível e insuportável ser. Um sujeito confuso, covarde e conformado. Tantas vezes desejei que fosse irreal, um mero fruto da minha imaginação, então poderia esquecê–lo, mata-lo e nunca mais vê-lo. Mas hoje, enfim, depois de olhar pela última vez em seus olhos eu cumpri minha promessa. E hoje... hoje eu tirei todos os espelhos da minha casa.

Nessa.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Bailes, Máscaras e(ventos)...

PARTE II

A loucura...

Chegou, entretanto, um tempo de demência.
Órfão, tendo perdido os pais ainda jovem, Erasmo perambulou pelas noites frias e úmidas, assistiu cortejos fúnebres e orgias reais - intrusamente fartou-se das melhores ceias - amou homens e mulheres, sonhou a realeza em suas camas sedosas.
Acordou dementemente triste. Gritou;
- “O mundo em que vivemos é louco, mais louco do que pensamos.”
Entregue à leitura, antídoto a quase toda “loucura”, dedicou-se apaixonadamente aos clássicos da literatura, de seu tempo e de outros tempos.
Percebeu, então, não ser único – “é nas loucuras que comete que o homem encontra a felicidade suprema...”

* continua...

Antonomasia.

nos chegou por e-mail...

O homem que perde as suas pernas ainda pensa; porém o homem que não pensa não é capaz nem se quer de andar. Ainda que com o coração e os pulmões debilitados, a capacidade de pensar não lhe é tirada. Tudo que é louvável lhe vai aos pensamentos, e sobre tudo o mais valoroso é o que tem a capacidade de decidir por seus próprios pensamentos que caminho tomar. A ciência desvendará muito além dos átomos, mas jamais chegará as raízes do pensamento: O baú mais seguro; fonte inesgotável. Felizes sois vós que em verdade pensam.

Daniel Henrique

sábado, 28 de junho de 2008

* * *


Chega o frio...

Os dias quentes se foram. Chega o frio.
As manhãs amanhecem geladas.
As tardes, continuam.
A noite cai, fria também.
Todos se recolhem, menos o poeta.
Este sai, bebericando algum trago
Envolto a neblina que cai.
E nós, submetemo-nos ao medo.
Medo de sentir gelar a alma
E de não voltar ao gosto d’antes.
Toleramos o verão para não amarmos o inverno.
Já não estamos nas ruas, sujeitos aos caprichos do tempo.
Vivemos acolhidos e escondidos em casa,
Na proteção do abrigo,
Debaixo d’um teto sem céu sem chuva.
Quietos e conformados. Contentes com tudo.
Pois chega o frio...
Sob tudo, dentro de nós.

Herman G. Silvani (Niko)



Castelos, Máscaras e(ventos)...

O último tijolo fora erigido.
O castelo estava pronto. Onipotente a aristocracia procurava os melhores costureiros do reino, jóias foram lapidadas, compradas, emprestadas...
Tudo cuidadosamente organizado, pensado...
A sujeira há longo tempo vinha sendo eliminada, as esmolas proibidas, os muros pintados.
Mendigos, viciados, loucos de toda ordem encaminhados a feudos distantes... o reino estava limpo.
Em uníssono a imprensa real divulgava o estado das coisas.
Uma alvura angelical e hostil reinava, pacificamente sobre o império.

Antonomasia

sábado, 14 de junho de 2008

POESIA VERTIGEM apresenta:

* Poesias autorais & de poetas catarinenses - & música

dia 21/06, sábado
19:30h
na Feira do Livro
Centro de Eventos

* Poesias sobre poetas, poemas & afins - & música

dia 27/06, sexta-feira
19:30
na Feira do Livro
Centro de Eventos

"Os poemas não evitam guerras nem curam a gripe, mas ajudam a suportá.las."
(Efraim Medina Reyes)

terça-feira, 3 de junho de 2008

Receio


A escuridão cai silenciosa
Em qualquer esquina acontece a noite
Ela sai acompanhada do medo
Companhia desagradável mas sincera
Com um único pensamento, continua
Passos largos, corpo trêmulo
Frio em pleno verão...

A mão do aperto-de-mão
É a mesma que puxa o gatilho

Carlito d'El Tango


uma música-poesia do Cordel do Fogo Encantado:

Sobre As Folhas (ou Barão Nas Árvores)

Contarei a história do barão
Que comia na mesa com seu pai
Era herdeiro primeiro dos currais
Mas gritou no jantar: "Não quero nada!"
Nesse dia subiu num grande galho
Nunca mais o barão pisou na terra

Passou anos e anos na floresta
Andou léguas e léguas sobre as folhas
Construiu sua casa feito ninho
Beijou sua mulher perto das nuvens
Um concreto bordado nas alturas
Com manobras de amor no precipício

Quando amanheceu entre dois prédios
De pastilhas brancas e tantos andares,
Um guindaste bem mais distante,
A luz, a sombra, a luz vermelha da roupa da aurora

Soube nessa madrugada

Do homem que não quis os minérios do pai
Que não quis os segredos farpados da mãe
Subiu numa planta, no alto da pedra, bem perto daqui
E ficou por lá.

José Paes de Lira

Literatura de bordel

Escrever e tomar vinho já não é mais característica de intelectual. Também barba cumprida e um alfarrábio entre os braços não caracterizam o mestre. Meu amigo foi taxado de louco após ser visto queimando um calhamaço que havia escrito no fim de semana. Perguntavam sem parar porque escrever se depois iria queimar!
Até era legível seus escritos, mas, era um escritor sem leitores.
Poderia certamente, com uma boa divulgação do material, ganhar alguns; mas não o quis: preferia queimar aquele emaranhado de letras em folha branca.

Dia após dia acordava cedo somente para escrever versos e prosas. Nos finais de semana sorria cinicamente ao ver a fumaça subir; parecia que conseguia ler nela toda verborragia que delirara ao longo de sete dias.

Marcio Serpa.



Quando chove

Ainda que eu não te tenha
Sou parte clandestina em ti,
E quando me olho no espelho,
No fundo do meu olho,
Vejo tua imagem soturna,
Eterna e distante.

Beijo tua boca
Cada vez que alguém te beija.
Deito em ti
Cada vez que alguém te deita.
Quando chora, sou aquele
Que te abraça,
E quando chove,
Como uma planta que se alegra,
Sou eu, um homem que sorri...

Pois você ressurge nas lembranças
Que descansam em mim.

Herman G. Silvani (Niko)


sexta-feira, 30 de maio de 2008

domingo, 11 de maio de 2008

Um aperitivo...

PERDÃO SE PELOS MEUS OLHOS


Perdão se pelos meus olhos não chegou
mais claridade que a espuma marinha,
perdão porque meu espaço
se estende sem amparo
e não termina:

- monótono é meu canto,
minha palavra é um pássaro sombrio,
fauna de pedra e mar, o desconsolo
de um planeta invernal, incorruptível.
Perdão por esta sucessão de água,
da rocha, a espuma, o delírio da maré

- assim é minha solidão -
saltos bruscos de sal contra os muros
de meu ser secreto, de tal maneira
que eu sou uma parte do inverno,
da mesma extensão que se repete
de sino em sino em tantas ondas
e de um silêncio como cabeleira,
silêncio de alga, canto submergido.


(Pablo Neruda - Últimos Poemas)

domingo, 4 de maio de 2008

Leminski falando de poesia:

http://www.youtube.com/watch?v=oEXklTvm3aU

para a liberdade e luta

me enterrem como os trotskistas
na cova comum dos idealistas
onde jazem aqueles
que o poder não corrompeu

me enterrem com meu coração
na beira do rio
onde o joelho ferido
tocou a pedra da paixão

Paulo Leminski

sábado, 26 de abril de 2008

* poesia *

Quisera eu ter, de um golpe, a infância dantes,

pra não passar p'la vida em mortes lentas...

Como quem mira, ao longe, as grãs tormentas

Temendo o palco a amores claudicantes.


Quisera eu ter na face o ardor dos erros,

As densas marcas que a beleza entalha,

A ser, aos chamarizes da mortalha,

um leito firme a abrigar enterros...


Quisera em meus afãs crepusculares,

Gravar o viço matinal dos cheiros:

Embevecer-me em nardos, sóis trigueiros,

Sacar das flores mádidos colares!


Quisera eu ter a púrpura dos beijos,

Rumorejando assomos de outras vidas,

A ter de perdurar nestas feridas

Que pintam em meus lábios graves pejos.


Quisera entardecer nas invernadas,

Cevando os olhos co'as idades todas,

Ser moço à vida já saudando as bodas,

Ser velho à morte em noites já veladas.


Quisera dedilhar num só momento,

Co'a rubra timidez dos meus anseios,

Sonetos de alegrias muito cheios,

Capazes de cessar o embotamento.


Quisera o pranto a selar este anelo:
Enfim, livrar-me do mordaz ditame
Dos que hoje vivem, neste berço infame,
Cultuando o Vício e conspurcando o Belo!


(Marlon Macarini)

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Vertigem pelo ar...


* Edes, Marlon, Vanessa, Liza, Herman & Rodrigo
- Grupo Poesia Vertigem -


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Poesia Vertigem em apresentação:


¨poesia brasileira & música...

25 de abril - sexta
UnoChapecó - bloco G

* 8h
evento de Jornalismo & comunicação

¨

No fundo do poço e cavando
é onde o poeta está.
Encontrar ela, a poesia,
sua busca eterna...

Poesia, a água que não vêm!

Poeta, com as mãos enterradas no lodo,
ébrio e divino e louco,
o que sempre se arrisca,
pois arriscado é viver,
e viver é saber a poesia nas coisas,
o mais, é apenas existir.

...e o poeta continua
em busca da poesia que lhe escapa entre os dedos.


Carlito d'El Tango



Lorenço choveu

Meu amigo Lorenço, ébrio e louco
Num dia cinza de outono
Pôs-se a imitar a chuva

Não sabia ele que não chovia
Pois acreditava na chuva
A chuva que não caía

Meu velho amigo bêbado
Soprava o ar com seu bafo quente
Fétido, úmido e mais velho do que ele

Mas Lorenço não sabia chover
Para ele a chuva cantava
Para ele a chuva passada não havia passado

Até que dormiu e choveu
E o som da chuva
Misturou-se com o da sua respiração

Lorenço finalmente choveu!


Herman G. Silvani (Niko)

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Deshojacion Sagrada

Luna! Corona de una testa inmensa,  
que te vas deshojando en sombras gualdas!  
Roja corona de un Jesús que piensa  
trágicamente dulce de esmeraldas!  
  
Luna! Alocado corazón celeste  
¿por qué bogas así, dentro de copa  
llena de vino azul, hacia el oeste,  
cual derrotada y dolorida popa?  
  
Luna! Y a fuerza de volar en vano,  
te holocaustas en ópalos dispersos:  
tú eres tal vez mi corazón gitano  
que vaga en el azul llorando versos!...

Cesar Vallejo

'um poema luminoso'...

Quatro horas da tarde/ O poeta sai de casa com uma aranha nos cabelos./ Em febre. Arde./ E a falta de cigarros faz-lhe os olhos mais velhos.// Segue por esta, por aquela rua/ sem pressa de chegar seja onde for./ Pára. Continua./ E olha a multidão, suavemente, como horror.// Entra no café:/ Abre um livro fantástico, impossível./ Mas não lê./ Trabalha - numa música secreta, inaudível.// (...) Sai de novo para o mundo./ Fechada à chave a humanidade janta./ Livre, vagabundo/ dói-lhe um sorriso nos lábios. Canta.// Sonâmbulo, magnífico/ segue de esquina em esquina com um fantasma ao lado./ (...) Febre alta, violenta/ e dois olhos terríveis, extraordinários, belos./ Fiel, atenta/ a aranha leva-o para a cama arrastado pelos cabelos/


António José Forte



a i z e o p...

meus dentes já podres caem
e não há nada que eu possa fazer
dizem os entendidos que talvez seja
a ação do tempo em mim

espero a morte indigesta do meu eu
o infinito não me merece e eu
não me importo com ele
este desgraçado que nem mesmo existe

mas continuo e ela não vem
talvez nem mesmo ela exista
espero incerto, mas convicto
de que um dia não mais serei

que venha o vento conflituoso em mim...

Herman ou Niko.

sábado, 8 de março de 2008

Poesia Vertigem apresenta:

leitura & recital de 'poesia européia' & música...

no café brasiliano
centro comercial Chapecó
dia 27 de março (quinta)
19h

entrada livre

*_*

Virei o mundo pelo avesso
E encontrei a liberdade:
‘Uma puta que sorri’...

Herman G. Silvani (Niko)

Crônica de Piratas / 2

Não tinha tapa olho nem perna de pau. Seu cheiro não era o mais desagradável. Pela primeira vez conseguiu um trabalho; iria vender Cds copiados em um computador residencial. O salário dependeria de seu caráter empreendedor.
No primeiro dia, apesar da grande dificuldade, conseguiu vender o suficiente para a refeição de toda família.
No segundo, quando ao fim do expediente, já tinha dinheiro suficiente para comprar um agasalho ao filho.
No terceiro, após uma violentíssima surra foi conduzido a Central de Polícia; seu material de trabalho e seus trocados foram confiscados; foi também nesse local que ganhou o nobre título de Pirata.

Antes de ser levado ao presídio ainda teve a infelicidade de ouvir a negociação dos Investigadores Civis na venda de seus Cds. O preço era irrisório. Ele não entendeu mais nada.

Marcio Serpa.

Crônica de menina / 4

Ruti sentira as primeiras comichões ainda pela mão do padrasto. As primeiras vezes foram a critério de educação sexual. Mais tarde já era pelo prazer de ensinar e aprender.
As lições foram se tornando intensas.
Todas as vezes que a mãe saía Ruti aprendia uma nova lição.
Começava a gostar das aulas.
Em pouco tempo Ruti estava formada em matéria de sexo. Seu padrasto havia lhe usurpado a infantilidade. Mas dela ninguém ouviu um só lamento.
Quando sua mãe soube da escola que a residência havia se transformado, ficou em pé de ira.
Ruti e sua mãe foram vistas ainda algumas vezes: Ruti na rua em estado de mendicância, e a mãe fazendo compras com o marido.

Marcio Serpa.

Fragmento de poesia de um poeta russo...

[...]

Íamos, sem saber para onde,
Perseguidos por miragens de cidades
Derrotadas construídas no milagre,
Hortelã e pimenta aos nossos pés,
As aves acompanhando-nos o vôo,
E no rio os peixes à procura da nascente;
O céu, a nós se abrindo.

Porque o destino seguia-nos o rasto
Como um louco com uma navalha na mão.

Arseni Tarkovski

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Conto à menina morta


...andava a esmo. Passado? Já não existia. Futuro? Já não importava. Pensava enquanto andava. Quilômetros percorrera pelas ruas imundas da cidade escura e pelas estradas desertas da rota trinta e sete. Tinha consigo milhões de dúvidas. Volta e meia, embriagava-se de um trago barato qualquer, comprado num bar qualquer, vendido por um vendedor qualquer. Não importava. Não raras vezes também chapava-se de comprimidos farmacêuticos, os quais a acompanhavam mundo afora. Tomava remédios desde que conheceu-se por gente. Saúde debilitada, mente conturbada. O medíocre psiquiatra não dera conta do recado, só viciou-a desde nova. Quando ainda virgem recebera do padrasto um estupro de vinte e quatro centímetros e quarenta e tantos minutos. Sangrou e chorou. Sentiu nojo e ódio, dor e desespero. E foi este o fantasma que a expulsou de casa e a perseguiu pelos seus dias. Tinha sonhos diurnos, e em seus olhos noturnos, só penetravam olhares tristes. Pensava ser Maria Bonita a procura de Lampião Sertão afora. Queria casar-se de vermelho com um homem bem mais velho, mas no fundo era lésbica. Gostava de sentir-se assim, contraditória. Amava uma atriz de novela e tinha tesão por uma atendente de uma lojinha de bijuterias baratas. Freqüentava bares obscuros, onde entorpecia-se antes de ir dormir. Também era freqüentadora de banheiros em shoppings center’s, pois estes, pensava, ‘eram limpos e bons para cagar’. Aliás, nada melhor do que defecar em paz, não é? Andou, andou e andou. Seus calos a faziam sentir desejo de morte. ‘Um bom motivo para o suicídio’, pensava. Mas a morte, estúpida como tal, não seria suficiente. Se fosse para morrer, queria morrer em batalha. Imaginava uma guerra contra o que chamava ‘Império do Norte’. Ela, é claro, compondo as fileiras do ‘exercito dos povos árabes e simpatizantes’, contra os ‘EUA e aliados ocidentais’. Ai sim valeria a pena morrer, com calos doloridos e tudo mais, já que seu amor impossível só era vista no cinema francês (leve-se em consideração que seu filme predileto era ‘Coisas belas e sujas’). Certo dia cansou. Encontrou um cactos de espinhos finos que fazia uma sombra curta, porém agradável, encostou-se por lá e descansou, até o próximo sol raiar... mas o sol, por sua vez, nunca mais raiou.

Carlito d'el Tango


Não ser...

Da janela do meu quarto

Vejo o mundo lá fora

Não compreendo mais nada

Nem quero compreender

Já foi o bastante

Me bastou ser...


el tango

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Hoje já não há perdão

A rotina me sufoca, o cotidiano me desgasta, o dever me oprime. Vou misturar-me a populança e redimir-me. Cantar bêbado, abraçado junto ás putas em vermelho. Esquecer da compreensão. Fugir do que se pretende lúcido e sagrado. Ser grão de soja jogado ao vento. Ser alegria e indiferença. Ser mundano. Esquecimento...
el tango.

#

Informações úteis para os desmemoriados de amor

Informação útil: Não adianta negar. Pelo menos alguns dos casos relacionados aqui você conhece. E se não conhece, já ouviu falar.

- Na década de cinqüenta, um grande fabricante de aspiradores de pó tentou introduzir uma pequena melhoria no aparelho. Colocou uma hélice giratória, uma lamina afiada como uma navalha, dentro da extremidade da mangueira de sucção. O que aconteceu foi que muitos homens correram para o hospital com os paus mutilados.

- A velha lenda urbana sobre uma festa surpresa para a linda dona-de-casa, com todos os amigos e familiares escondidos num quarto, e quando eles saíram gritando “feliz aniversário”, encontraram a mulher estendida no sofá com o cachorro lambendo “amendocrem” lambuzado entre as pernas dela...
Bom, tudo isso é real.

- A lendária mulher que paga boquete para o cara que está dirigindo, só que o cara perde o controle e pisa no freio com tanta força que a mulher corta-lhe o troço pela metade... essa eu conheço.
Essa gente é a razão pela qual toda seção de emergência hospitalar tem uma broca com ponta de diamante: é para conseguir furar os fundos espessos das garrafas de champanhe e soda, aliviando a sucção.
São essas pessoas que chegam caminhando com dificuldade de madrugada, dizendo que tropeçaram e caíram em cima da bisnaga, da lâmpada, da Barbie, das bolas de bilhar, ou dos camundongos de estimação.
Ver também: taco de bilhar.
Ver também: bichinhos de estimação.
São pessoas que escorregaram no chuveiro e caíram, acertando em cheio um frasco de xampu escorregadio. Gente que é sempre atacada por uma ou mais pessoas desconhecidas, e vive sendo violentada com velas, tacos de beisebol, ovos cozidos, lanternas e chaves de fendas, coisas que depois precisam ser retiradas. Bem, pelo menos é isso que elas dizem...
Há também aquela da empresária bem sucedida que passou por uma lavagem do estômago onde foi achado meio quilo de esperma.
E aquele que foi encontrado no cinema com o pau entalado no fundo de uma caixa de pipoca tamanho grande. Ele estava assistindo a “Rocky Balboa”. Não me perguntem como ele conseguiu...
Há aquela garota, a namorada do primo do seu melhor amigo, que quase morreu se masturbando com a alavanca de cambio de um Fiat 147.
Há o homem aleijado pela máquina automática de ordenhar vacas.
A garota nua, pendurada na barra da cortina do chuveiro e quase morta de asfixia auto-erótica.
O cara que esfrega o sêmen nas abas dos envelopes de depósitos nos caixas eletrônicos.

Continua...
Coyote Martinez

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

...


Tristes lembranças de uma vegetação

Gotejavam teus imensos galhos
Num dia de garoa espessa
Enaltecendo a beleza
Da paisagem em que tu te fazias figurar

Lembra- te do episódio das abelhas
Quando enxamearam tua copa mais alta
E em ti foi abrigado
O melhor mel de toda a mata?

Mais bela ainda te tornavas
Quando em ti a passarada pousava
Ou em ti faziam seus ninhos
A colorir tua imagem de cores e cantos

Bons tempos aqueles
Em que a floresta nos abrigava
Agora já estamos sozinhas
Sobreviventes da ultima queimada

Lastimável é tua estada
Quase seca, sem folhas,
Tua imagem tornou-se fantasmagórica
E hoje, por quase ninguém é notada

As crianças que ao teu redor brincavam alegremente
Tornaram-se indolentes adultos
Tua presença fingem não reconhecer
São resquícios de vida em vultos

Dia após dia te vejo adoecer
Lacrimejam teus galhos
E eu contigo continuo
Insignificante, a sustentar orvalhos


Herman G. Silvani (Niko)